ÀS ESCONDIDAS
Agosto 17, 2012
Não tenho mão em mim. Como havia de ter
A mão na minha vida, a mão no meu destino?
Nasci para ser só, perdi-me sem querer
Brinquei às escondidas num jardim sozinho.
Sou branco do papel, caído, amarrotado,
Vivendo num cubículo onde o ar é nada,
Alegro-me com pouco, sóbrio, dilatado
Da beleza doentia que encontro, apavorada.
Os meses que passaram sobram-me de tédio
Não sei o que serei, se virei amanhã
Queria ter para mim uma Vénus de Milo
Ou abrir livrarias no centro de Canaã.
Quero uma coisa e outra como uma mulher
Que não sabe o que quer, volúvel, pensativa
Que imagino sonhando o mais alto prazer
Fora duma rotina que a mantém cativa.
Meu mundo, um areal, o mar, a realidade,
Contrariado nado até ficar sem pé
Exalto-me em comícios loucos de verdade
Contruo mentalmente pirâmides de Gizé.
Memória, és a necrópole de sentimentos
Da infância, barco à vela num mar de ilusão
Meus sonhos nascem como amoras que não como
Bebo cada momento com sofreguidão.