A Maria João de Sousa Brito
Quem nunca procurou a paz num vinho ardente
Com suas memórias ígneas, amadeiradas?
Procuro, não no vinho, mas em mim, demente
Uma alma sossegada entre almas transtornadas.
No sábado passado, azul raro, vibrante
No ferry boat seguia a esteira, alvos cavalos
Que a branca espuma faz o mar ser um espumante
Que bebemos festivos, aos pulos, aos saltos
Pura desilusão, confesso, pois buscava
Golfinhos saltitantes que há muito partiram
Em busca de sossego como eu procurava
Poemas cujos versos nunca se repetiam.
O sol na areia dava a impressão de sermos
Vulneráveis papéis que servem de alimento
Ao fogo, esse demónio à solta que metemos
Nas verdes florestas do nosso pensamento.
Aquela língua branca a desafiar o mar
Não era como os sonhos loucos dos humanos
Anseios vacilantes, no ar a latejar
E que nos guiam sempre ao ponto a que chegamos.
E eis (lá está) que chega a fome melancólica
Desse infindo desejo, fútil, impossível,
De sermos novamente jovens e, bucólica
Ser a paisagem verde, vinhas do possível.
De súbito, arrepio na espinha a expandir-se
Lembrei-me ser durável, ter que ter coragem
(Mas de volta ao real) era o meu filho a rir-se
Como água a extinguir o fogo da voragem
Como um poema longo, épico, interrompido
Fui perseguido pelas ânsias, mágoas, dúvidas
E remontava ao tempo desse grego Antigo
Que colocava freio a vidas compulsivas.
E de repente, Tróia, a amargurar-me o espírito
Ulisses de calções de banho, toalha aos ombros
Helena em bikini, águia de Zeus aos gritos
Essa bela cultura grega agora em escombros.
Deixava atrás de mim um rasto purpurino
De todas as lições de vida que aprendi
Porque sou um mistério raro, diamantino
Com o cruel destino sempre atrás de mim.