O pianista
Maio 28, 2013
Se tocasse piano seria sozinho.
Mas não Tinha de escrever versos, ainda por cima versos
Que nunca andarão na boca do mundo.
Às vezes tenho a sensação que não tenho sensações
Às vezes sinto que me faltam sentimentos
E tudo se resume ao que nunca alcancei
A tempo, de ser brilhante e forte,
Frio e predador, respeitável, enganador.
O meu rosto não é um círculo tricolor,
Nem arco ou flecha que dispare o tempo,
E a minha cabeça lateja de tanta porcaria
Que absorvo, bebo e como. São perfeitos os outros.
Tinham de ser perfeitos e príncipes...
Tenho a sensação que não têm sensações
Nem sentimentos, nem versos,
Porque os versos para eles são brinquedos
Sonhos infantis, ridículos e repelentes
Para a insensibilidade irreversível,
Pois as pedras existem. Esqueçam, não são flores
Não peçam ao tigre que ame a presa
Quando corre, corre porque sente a falta disso
É como cuspir para o chão e criticar
Os outros quando cospem no chão,
Ou como não ser uma coisa
E não deixarem os outros ser coisa alguma.
Por isso acusam-me tanto,
Por isso estendem-me o dedo indicador
Porque como o outro que não ia por ali,
Eu vou porque preciso de comer
E guardar sonhos como rebanhos dispersos.
Tenho ido espreitar o precipício
E pensar na queda mortal que darei um dia
Quando a Morte se fartar de ver-me perto
E espremer-me nas mãos como uvas sequiosa de vinho
Já vi corvos bicarem maçãs podres
Caídas de árvores curvadas pelos ventos
E vendavais de emoções e sensações não vêm
Como uma empregada doméstica, coitada,
Vir uma vez por semana limpar-me a vida.
Sucumbo aos olhos dos outros, morrendo de tédio
Chamo a atenção de mim próprio
Só para manter-me acordado.
E que difícil tem sido manter-me acordado
Por não saber tocar piano…