Há lobos vorazes no meu sangue…
Quando a noite cai da cúpula celeste
Descem das florestas obscuras dum poema
Agrupam-se e travam combates ferozes
Entre o meu querer e o meu ser.
Criança fugitiva, trémulo de rosto pálido,
Chegaste-me como uma lua perdida e adoentada
Suspensa no destino igual e geométrico;
Teus olhos brilhavam de tristeza
Nem teu rosto recebia luz, estiolado de medo
Sujo, vinho derramado e criminoso
Vertigem sentir o pavor das luzes invadir-te
Depois que brincaste fora da vida e de mim,
Dor repartida, pão guardado num pano
Água colhida das chuvas beijadas nas folhas
Enquanto nos aquecia esse fogo rebelde
De ter sonhos, vida e esperança vivaz.
Acolho-te, órfão que és, homem que foste
Protejo-te de mim próprio, perigo inocente
Raspo o fundo do tacho das sobras
De metáforas fundidas em sangue e dor.
Tu, testemunha do esforço de esquecer
Essa navalha furtuita de noite
Que se me revelara fria, afiada de beijos
Escondidos ao luar nas noites solitários
Corujas nocturnas de palavras e nervos
Cravados em mim como frases em túmulos.
Para onde irás se não sabes tomar conta de ti,
Se és provérbio alado, sibilante, matutino
Saído da boca sábio dum velho desprezado
Curvado, folha outonal?
Como serás depois do perdão,
Se um pé gigante te esmaga o rosto
Se o reflexo no lago não é o teu,
Ou se preferires, como andarás na terra
Cego de amor ou carente dele?