Rígido e doente, inquieto, como um gamo,
Que corre na floresta, esquivo se pressente,
Perigo, na presença, de alguém que não amo.
Que vento agita as águas profundas da mente?
Com encolhidos ombros, retesados músculos,
Na boca, a aridez dum inóspito deserto,
eu que já pintei centenas de crepúsculos,
Eu que o sal dos olhos em doce converto,
Mesmo sendo doente, sou porto seguro,
A mim ancoram almas doentes como eu
Em vão tento tingir de branco o negro impuro,
Corpo, único milagre que um dia Deus me deu
Parado, encosto à terra, atento, meus ouvidos,
sonhando ser formiga, mosca, escaravelho
Deitado na pétala da flor e estendidos,
Morrem meus sentidos, ao ver-me no espelho,
Eu que subo e desço tantas, tantas vezes,
As ásperas montanhas erguidas em mim
Que procuro viver anos em poucos meses,
como se amanhã fosse o derradeiro fim
Eu que sinto água fresca no monte reunir-se,
Saltando, aos empurrões, terra, rochas, pedras
E num fluir alegre sinto a terra a rir-se
E borrifando flores, prados, grutas, serras
Hei-de ser gota um dia, em água transformar-me,
Extinguir o fogo ardente da falsa quimera,
Expelido da sua boca, para libertar-me
Que dos sonhos reais a vida não quisera.
Hei-de engolir inteiro o léxico infindável,
Servir-me de palavras belas como as flores,
E perfumar o céu do espírito, insondável,
Onde protejo tigres, tubarões, condores