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POESIA ÀS ESCONDIDAS

Poemas escritos por António Só

Alcatraz

Julho 20, 2010

Quantas teias me tecem meus enganos:

Tristezas – cestos de frutos amargos

Viver – prisões, deveres e encargos

Lembranças – trazem vozes de outros anos

 

Cheias de glória dourada, outras eras,

Onde um puro sorriso conquistava,

E a amargura uma lágrima me dava,

Girando apaixonado noutras esferas.

 

Agora giro! Enjoo nesta viagem,

Meu velho barco atraco sem bom porto,

Cercado pelas ondas que o mar faz

 

Bem sei que a vida é breve, uma passagem

De noite vivo, ando de dia morto

Com a alma presa, presa em Alcatraz.

Entre o Céu e a Terra

Julho 13, 2010

Traí a confiança da Musa antiga e bela,

Nascida como um vento nascido no oriente,

Não basta ter o brilho etéreo de uma estrela,

Sabe-me muito a pouco ser somente gente.

 

Acolhe-me, no leito, tu que não te vejo

Que me disseste um dia haver um outro em mim,

Abrindo-me os portões pesados do desejo

como à noite se solta o cheiro do jasmim.

 

Perdoa-me! Que faço com a doce vida

Como se inútil fosse lúdico brinquedo,

Vi minha vida sempre a ser por ti vencida

Fui recorrer a ti para espantar o medo.

 

Na infância tempo havia, pra deitar-me e ver,

Num público jardim com a relva cortada,

E a folhagem dos choupos no Outono a perecer

“Eu sou feliz”, pensava, sem ter minha amada.

 

Amor era o que via, era o que a flor mostrava,

Era o que respirava, o ar, o sol, o mar

Era de tarde a areia fina que escaldava

E me aquecia dentro a alma a resvalar.

 

Era fechar meus olhos contra o sol e ver,

Pontos minúsculos de cores desiguais

E aquele azul do céu vibrante preencher

O espaço, cheio de culpas e dúvidas fatais.

 

Era quando chovia e o sol ao mesmo tempo

Nos dava o Arco Íris nítido, perfeito,

Que ali sonhava andar, no fim do mês Setembro,

Que o Verão se curvava ao Outono com respeito.

 

E as ruas enchiam-se de folhas espalhadas,

Na terra borrifada por chuva miúda,

e as árvores desnudas, como atormentadas

Pediam com pendentes ramos por ajuda.

 

Saudades, quando as ruas eram infantários,

E não se tinha medo de brincar na rua,

E os nossos jogos em compassos quaternários

Eram o nosso curso, o curso igual à Lua.

Soneto de Verão

Julho 06, 2010

Sou a cobra no jardim do teu desejo,

Que se enrola nos teus braços, ombros, pernas

Na volúpia das carícias suaves, ternas,

Que à tua boca vai roubar-te um beijo,

 

Tocar-te a intimidade levemente,

Na ímpar suavidade dos amantes,

Que tornam os movimentos circulantes

Como no leito o amor, justo consente,

 

E a língua audaz, furiosa e destemida,

Escreve poemas no teu esbelto corpo

Um verso improvisado como escrevo

 

Move-se em círculos, sobe, e na subida,

Descobre a caminhar um novo sopro

De quatro folhas, teu amor, em trevo

O Retorno

Julho 01, 2010

Rígido e doente, inquieto, como um gamo,

Que corre na floresta, esquivo se pressente,

Perigo, na presença, de alguém que não amo.

Que vento agita as águas profundas da mente?

 

Com encolhidos ombros, retesados músculos,

Na boca, a aridez dum inóspito deserto,

eu que já pintei centenas de crepúsculos,

Eu que o sal dos olhos em doce converto,

 

Mesmo sendo doente, sou porto seguro,

A mim ancoram almas doentes como eu

Em vão tento tingir de branco o negro impuro,

Corpo, único milagre que um dia Deus me deu

 

Parado, encosto à terra, atento, meus ouvidos,

sonhando ser formiga, mosca, escaravelho

Deitado na pétala da flor e estendidos,

Morrem meus sentidos, ao ver-me no espelho,

 

Eu que subo e desço tantas, tantas vezes,

As ásperas montanhas erguidas em mim

Que procuro viver anos em poucos meses,

como se amanhã fosse o derradeiro fim

 

Eu que sinto água fresca no monte reunir-se,

Saltando, aos empurrões, terra, rochas, pedras

E num fluir alegre sinto a terra a rir-se

E borrifando flores, prados, grutas, serras

 

Hei-de ser gota um dia, em água transformar-me,

Extinguir o fogo ardente da falsa quimera,

Expelido da sua boca, para libertar-me

Que dos sonhos reais a vida não quisera.

 

Hei-de engolir inteiro o léxico infindável,

Servir-me de palavras belas como as flores,

E perfumar o céu do espírito, insondável,

Onde protejo tigres, tubarões, condores

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