Corro atrás do tempo como um louco,
Estendo a minha mão, mas não consigo,
Chegar-te, ó livro, silencioso abrigo,
Para que não me saiba o dia a pouco.
Corro atrás do verso que não escrevo,
Agora vejo o quanto outros ousaram,
Agora vejo o quanto outros cantaram,
O que não canto, e nem sequer me atrevo.
No rosto em chamas da minha secura,
Corro atrás do sopro desta brisa
Sorrindo suavemente a Mona Lisa
Falta-me um químico que é a loucura
Tudo o que vejo, lembro, adoro e amo,
Me maravilha, eu que não fui além,
Das ilhas lá de Espanha. Sou também,
Do tédio um fugitivo, aflito gamo.
Corro atrás de fantásticos sonhos,
Guardados no meu íntimo inquieto,
Ando, nas conversas, circunspecto,
Fixando no vazio olhos tristonhos.
Invade-me uma agonia experimental,
Berrando-me aos ouvidos da minha alma,
A carteirista que me rouba a calma,
Enquanto eu viro costas ao meu Mal.
Não me demoro muito na conversa,
Pois corro atrás do tempo, atrás do vento,
Para gritar-lhes só meu pensamento,
Com o estrépito do grito que é meu verso.
Anda atrelado à gente a depressão,
Da crise, a gripe, a morte, a agonia,
Maldita sombra em cima deste dia
Vive-se afeiçoado à maldição,
Ter corpo, carne e osso, caprichoso
Sentir fome, ter sede e ser complexo,
Roçar-se pelos céus por não ter sexo
Gemer no escuro como um cão raivoso.
Cidade antiga cheia de fantasmas
Foram-se embora, sem deixar saudade
Que estranho amor, amar esta cidade,
Cheirando a vício, a éter, a miasmas.
Os meus ouvidos sangram diariamente,
Tenho comboios dentro da cabeça,
Perco-me facilmente na conversa,
Com um velhote exausto, tão doente.
Corro e corro…mal respiro… e corro
Ando sem fôlego, ofegante e morto,
Lívido espectro, farto andar absorto
Sou mancha de óleo e na cidade escorro.
Sinto-me entrar dentro de um lar qualquer,
Vendo num livro o sol da absolvição
Passando a tarde inteira a ler, a ler
Fugindo à conversa sem coração.
Eu corro atrás de tudo, atrás de nada
Sou vagabundo posto num cubículo,
Fechado, exposto num mundo ridículo
Como um poeta chora a sua amada.