«Pinturas colocadas num catálogo:
A escolha, num mover de olhos: o amor,
Surge, milagroso, num diálogo,
Que esmalta árido peito de verdor .
A nova imagem trepa ao pensamento,
Entrando no meu templo devagar
Acende, reacendendo, dando alento,
A quem, do outro lado me quer ‘amar
Procuro quem procura e alguém encontra,
Deixa-me uma romântica mensagem,
De um extremo tesão que embate contra
À rósea flor, na amorosa linguagem.
Olho como te abro as pernas, como
Orquídeas, cujas pétalas coradas,
Mostram rosadas partes só num tomo,
De beijos, de carícias orvalhadas.
Num gozo prometido, não me digas,
Guarda-o bem no teu saco permanente,
Terás esmolas que tanto mendigas,
Terás a tua Vénus, certamente.
Quero que só me ensines a voar,
Minhas asas incites, pomba branca,
E do meu corpo excelso me arrancar,
Da solidão, onde a minha alma estanca.
Traz os teus braços fortes, as mãos rudes,
Entumecendo o músculo nervoso,
E arrebatadamente me desnudes,
Com teu corpo de Apolo vigoroso.
Oferece-me, não túlipas, mas beijos
Mordentes. Deixa as flores no tapete,
Que a tua língua traga mil festejos,
E as tuas mãos rebentem meu corpete.
E que me queime do teu corpo o fogo,
Vulcânico, com raio fulminante,
Descer-me aos lagos onde amo e me afogo,
Num coração feroz e palpitante.
E tu, ó noite, cobre os meus segredos,
Que avance o mundo sem que eu faça parte,
Caminho há muito à sombra dos meus medos,
E possa, Vénus, entreter-te em arte.
Confusos os meus lábios, beijam bocas,
Tão líquidas, frementes, tão nervosas,
E as que beijei, ó deusa, foram poucas,
Porque provar eu quero as mais gostosas.
Exala, no meu corpo, hálito doce,
Dos nardos as fragrâncias e me tragas,
Felino olhar como se lince fosse,
Olhos com que me entregas e me afagas.
Pois fui, por teu alado filho, ferida
Com a dourada seta tão certeira,
Na louca excitação, a minha vida,
Tornou-se mais honesta e verdadeira.
De socorrer paixões, gemidos, ais,
Julguei-me a preferida do diabo,
Entre ânsias, cravam-me versos fatais,
Onde estremeço, grito, onde me acabo.
E possa vir-me vezes, quantas folhas
Frondosa árvore tem, quantas estrelas,
E amante, que com teu suco me molhas,
Entrega às Parcas vindouras sequelas.
Vem divino, amante, consolar-me,
Possas nervo de fêmea, me amansar
Da minha campa, vem desenterrar-me,
Senta-te e relaxa... Deixa-me amar... »