Teu sorriso ingénuo e ternurento, É o palrar tão brando de criança; Faz na Alma ainda ter a esperança Na busca efémera de puro rebento. São raras as flores nascidas, só lembrança, De encontrar quem, resistente ao vento Infantilmente sorri sem ardil, intento, Luzindo entre quem sorrir pesa e cansa. Se luz perfume fosse, asperges então Estes corredores de ébano cerrado; Sem que santa sejas, tens-me curado, Minúsculo ponto de luz na escuridão. Humilde alma, que ris-te de ti, Se graça houver, imploro-te: ri!
À existência minha pouca e baça, Se teu amor por mim te amordaça, Libero-te do sentimento nobre, tombando. E quando do mar despojo assim eu for, Nem uma lágrima derrames de amor, Por mim! Te peço humildemente; Só meus entes rochosos sentir-me-ão Nunca de alguém prendados por um: Perdão! Pois vivem, resistindo honradamente.
Estarei quieto, feito mártir, rochedo, Ó mar de lágrimas tuas vertidas, Nas vagas os ventos mágoas trazidas, Onde estremeço... Porém, livre do medo. Que Amor disfere frases puras, sentidas, Antes dor, a revolta em ti vem cedo? Esfolas-te somente tu no rochedo E tuas lágrimas em mim embutidas. Quantos ventos invocas, vagas de fúria, No fim sorrindo quando da minha penúria, De vontade hercúlea de resistir; Tombando sempre se vive livremente, Se não deixar na vida nada pendente, Antes a Morte que o Real porvir.
'Inda sinto entranhado, Fundas feridas do meu passado, Qual bálsamo aplicado em mim... À pele não dou descanso, Viajar nele não me canso, E dar ao desassossego fim.
Qual martírio é este? Já alguma vez te rendeste Ao despotismo do teu ser? Rebelião inútil! Terei um futuro fútil, Se no porvir me arrepender.
São lógicas tresloucadas, De almas mal fadadas, Quantos passos avançarei, Nas escadas do pensamento, Nos céus do sentimento, Se pensar que nunca acordei.
Quantas horas me restam Medos, dúvidas que infestam, Extinguir em feixes de ouro, de luz, Do berço frio abafado, Cantar meu próprio Fado, Que de impulsos, obras produz.
Torna o homem fecundo, Quarto barrado e imundo, Com palavras se alimentando E se as penas se acabam, Temo que feridas se abram, Vivendo só delas tratando.
À mulher fatal, fatal destino Como quem disse que tombaria Pela espada se dela vivesse, Pela espada, sucumbaria.
Ter esperança? Tenho-a nos outros, E para mim nenhuma guardo Essa força que levita o fardo Tornando-nos vivos e não mortos.
Existe Sol, a luz e as flores, Existe um berço chamado Amor, Amaldiçoo-me das malditas cores, De tudo amar causando dor.
Se meu coração cessasse um pouco, A eterna fome e sede de inverter, O cântico mudo, gasto e rouco Feliz sería, ingénuo até morrer.
Nem tão pouco sei como já ando, Nas ruas estreitas, ruas de imundice, Mas colho mensagens de um livre bando, Que desmascara a vil canalhice.
Sinto uma compaixão que comove, De quem passará por mim agora na rua, Viola tocando pedindo e continua, E livre entregue a si mesmo se move.
Sempre me enganei a ajuizar pessoas, Pois não chego a fazer juízo algum, Não sou juíz nem tão pouco mártir Sou neste mundo atroz apenas mais um.
Continuarei pecando como antes, errando Sem aniquilar a natureza que em mim floresce, Sou mármore esculpido que de si não esquece, Que outros para além de mim, vão mais pecando.
Sentado na pedra fria duma masmorra, Invoco o que em tempos tanto vivi Mesmo que passado o tempo não socorra, Olho à frente o azul que outrora vi.
Estreito se apresenta ainda a vista, Qual mente hérculea invoca alucinações, Quando pelo muro branco se avista, Ao seu redor, distante de reais visões.
Embalado o berço que se agita brando, Por mão extremosa, a mente, como uma Mãe, De recém nascido longe ainda do bando, Que terá seu tempo de voar também.
Um ponto azul naquela vista primeira, Inquieto se asperge e o corpo se afasta, E o mar surge-me de fronte, visão pioneira Do globo terrestre dorido pela 'fina' casta.
Gaivota sou?!? Albatroz, e sigo a caravela que em direcção à costa serve-me de guia Nem Sol ou Lua a costa anunciam. É ela! Ilha Perdida que não existe. Todavia,
Provo ao toque leve a fina areia Servindo-me da mente, apenas recordando-a, Essa realidade atroz que sorve da veia, Sangue da poetisa vida, drenando-a.
De sonhos meu viver não basta; resta Parte do meu instável ser e intranquilo Parte da minha alma não parte nesta Barca, rumo a um porto calmo e tranquilo.
No chão se espalham histórias de criança, Lançados ao inglório vento, vento funesto, Ainda guardo no sonho uma tola esperança De superar-me. Mas hoje... hoje não presto.
Do que fui e sou, nos escombros remexo Almas gentis e puras de outros valentes Que abrem apixonados trancos e fechos De almas agrilhoadas e dependentes.
E sinto por mim compaixão momentânea Como a núvem que depressa no céu passa. Será que 'inda minh' alma é consentânea Com o que fui? Ou sou já a igual farsa?
Mais tarde arrepender-me-ei, Do tempo que agora passa, Mais tarde recordar-me-ei Que a vida é escassa, Que é um tesouro, Escondido e breve, Descoberto no peito, Quando se sente leve.
Mais tarde? Basta! Hoje e não amanhã, Porque a torna gasta O tempo,a Alma vã. Tacteio o escuro Na mansarda do destino Que sempre me é indestinto Nunca me chega o que sinto Quando acordo pela manhã.
Não me sinto livre Minha Musa, minha amada Nem no punho deslize Numa folha amachucada. Só sinto esta dor, De viver alienado, De sentir nestes dias Vazios, emboscado.
Tem batido meu rosto, Nas portas da alegria, Definho na realidade, Definho na poesia, E se oiço mentiras, Tantas, à minha volta Finjo-me que esqueço O mentiroso e sua escolta.
Se esta vida recuso, Porque hei-de eu vivê-la, como mendigo ou recluso, Sem desejar perdê-la? Lanço-me no abismo, de perguntas e monólogos, A vida é um eufemismo, De constantes diálogos.
Mas suprimo a dor, quando contigo eu estou, Repousando num abraço, como quem nunca abraçou, E saindo da teia, Que me prende no dia, Contigo, dulcineia, Tenho a sublime poesia.
E quando o astro ilumina Na alvorada ao amanhecer Com a suave luz fina, Tenho de me desprender, De ti e invocar, Uma vontade feroz, De enfrentar um mundo, Que é falso e atroz.
Vivo numa ânsia, constante e irredutível, De escapar de gaiolas, Sonhando (irreversível) Que não basta vaguear, Nesse sonho constante, E do avesso revirar, Minha vida de pedante.
Mas no escuro existe, Uma borboleta ousada, Que asperge de luz, A escuridão cerrada, E em mim induz, Força para continuar És tu, minha Fada A borboleta a esvoaçar
Subo gradualmente as escadas, Ó Mãe Natura Observo o Humano feito, algoz do futuro, E impotente fico nesta inércia que perdura, Deixei de viver em tempos; agora, apenas duro.
Mas oiço atento os versos que cantas efervescente Rasgo um sorriso curto como quando o sol se vê, Retida gente nas trevas que desponta quando de repente Contempla-se num gozo como uma bela frase se lê.
O extremo é intolerante e vejo nele vossos impulsos, Ó mares, ó ventos... ó Terra que nos estremece. Somos embalados pelos doces e brandos impulsos, E abalados somos quando Neptuno se enfurece.
Onde estão os tesouros escondidos Debaixo da aridez da gente, Onde estão os espíritos perdidos, Que sonham apaixonadamente Pela beleza à vista obtusa, Explícita, e consecutivamente Caem sobre braços de Musa, Do Amor, curiosamente?