Perdão
Julho 15, 2008
Mostrei-me pouco humano, amor. Agora,
a penitência sofro por escolha,
Da conturbada e amaldiçoada hora
Já não há mais entulho que recolha.
Pesam-me os olhos turvos de cansaço
De mim não digo bem, só bem de ti
Abre-me os braços, cede-me um abraço
Por não querer sofrer mais que sofri.
Já basta não ver mar, não ter-te ao lado,
Aquele verde monte estar distante,
Nunca me basta ter-me afortunado,
De ter-te por estrela mais brilhante.
Afogo-me em funestos pensamentos
Como se perto visse um monstro enorme
Erguer-se desse mar. Sopra-me ventos
De feição, para ver-te e recompor-me!
Até as árvores gritam-me: “Louco!”
Até flores as pétalas me fecham
O que vejo e me sabe sempre a pouco
Contemplar, não me deixam, não me deixam,
Por ver-te triste rosto, os lábios roxos
Secados pelos versos que te disse,
Desde ontem que meus versos andam coxos
Herança dos que invocam casmurrice.
Meu lago transparente, águas secretas
Minha andorinha alegre já não voa
Cúpidos olhos donde agudas setas,
Me ferem, por não ser melhor pessoa.
Minha Pietá, meu lírio imaculado,
Meu fio fresco de água em minha boca
Diz-me, sinceramente, se culpado
Serei, por arrastar-me à minha toca?
Esquivo-me, bem sei, do que pretendes
Ó ave meiga e mansa deste canto
Mas meu capricho inútil não entendes,
Causa-te susto, sem causar-te espanto.
Foi preso Prometeu lá na montanha,
Agrilhoado foi por ter roubado
Aos deuses útil fogo, coisa estranha.
Serei culpado por ter-te inflamado?
Sejam meus actos deslizar de gôndola,
Minhas palavras lustres de veludo
Meu coração que seja ave que pula,
Como se ela sentisse alegre tudo.
Minhas carícias sejam almofadas
Perfumadas entre nossos lençóis
Estes versos, bandeiras desfraldadas
Sejas meu sol entre mil outros sóis.
Empilho imensa coisa pra dizer-te,
Mas uma coisa só dizer-te basta,
Para voltar no nosso ninho a ter-te
A culpa é minha, amor! Eco se arrasta
No vale ressoando nosso amor,
Bendito coração que tanto prezo,
Tratando diligente dessa dor,
Que meu amor recusa e dá desprezo.
Sinto-me a sombra fria quando a nuvem
Oculta o sol vaidoso de esplendor,
Sinto que tenho a dor que ninguém tem
E sou da humanidade devedor.
E quando de mansinho abrir a porta
E ver-te o rosto, eu logo saberei
Se toda esta tristeza será morta
Por um sorriso ténue. Logo verei!
Porque meu rosto, amor, empalidece
Na rigidez do corpo eu me transfiro
E toda a gente amor me reconhece
Dizem-me que pareço co' um vampiro.
Porque enrijeço os membros de tensão,
Sinto arrepios de morte quando vejo
Novamente não ter teu coração,
E quanto mais me culpo, mais fraquejo
Na ânsia de obter de ti teu perdão.