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POESIA ÀS ESCONDIDAS

Poemas escritos por António Só

A mão invisível

Novembro 27, 2017

Os rostos lunares tombavam   olhos tortos

abrindo páginas escritas com vazio

vivem como se a morte alheia viesse e mortos

tremem de solidão, de fome de nada, e frio.

 

escorrem-me dos olhos lágrimas de fogo

caminho num pomar de frutos proibidos

não sinto os meus sentidos torpes submetidos

a indefinidas forças ou peças dum jogo.

 

somos lixo universal génios da garrafa

nem esta mão que tapa a boca cala a minha

em verso nesta mesa posta à eternidade

 

a garra que me ferra é a mesma que essa faca

que cedo me atravessa de manhã a espinha

que arrepio que sinto não ter liberdade

Chapéu de palha

Novembro 13, 2017

De tudo o que podia fazer e nunca faço

ou que podia erguer mas que nunca ergo

da reestruturação da idade e do espaço

sentindo o universo preso com um prego

 

ou fita cola adesiva como a infância

ter passado tão depressa como eu a vivi

e nesta idade adulta ainda ser criança

e nestes anos ver as vezes que morri

 

e ver que sou igual a este verme que anda

a revolver o solo a ver se o vendaval

não chega, e se chegar, que seja como o panda

rotundo a rebolar no mundo desigual

 

O que é da vida não mais do que o estômago

Se o pombo diligente viva da migalha

E por promessas não cumpridas, o meu âmago

É um disco voador como um chapéu de palha?

outro igual degredo

Novembro 10, 2017

Em cada ofício há dores e cansaços vis

rostos e olhos baços, vítreos, instrumentais

crescem-me ânsias-trepadeiras de escrever

a tinta permanente poéticos punhais

 

ser vírgula no papel infinito no átrio

do céu ou sentir solidões de baleia

azul, ou ser chefe de turma ou de pátio

que presídio existir sem versos e ideias

 

redimir-me sou insolente, a minha infância

fechou-me portas com estrondo muito cedo

tabefe injusto de mão suja a uma criança

 

sentir-me que estou vivo às vezes mete medo

como sentir o peito a germinar esperança

que nos conduz e leva a outro igual degredo

O Príncipe Imperfeito

Novembro 03, 2017

ninguém por perto, vento, dunas no deserto.

e se saísse agora? não dariam conta

o silêncio permitido é um sol descaído

igual ao gorila irado que nos confronta.

 

perdi sonhos coloridos, a alma labiríntica

são túneis e trincheiras na terra escavados

se lúcido dormisse num copo de absinto

degolaria o tédio e sono mascarados

 

a obrigatoriedade do Halloween, são dias

que nego fantasias e dentes postiços

prefiro carnavais, orgias, bacanais

charcutarias tais, presuntos e chouriços

 

a penumbra fria sepulcral da igreja

vitrais multicolores lindos atractivos

é gárgula sombria que inspira suspeitas

a transformar-se em Cristo vago, pensativo

 

seca, poeira ao vento, voo em pensamento

em fios finíssimos quase imperceptíveis

de seda, aranhas tais que tecem esquecimento

fugindo das pessoas más, incorrigíveis

 

prova-me o contrário, eu te farei sinal

para que entres no palácio de pó e nada

ajuda-me a tirar adagas e punhais

que em mim próprio cravei por me sentir errado

 

inadaptável a ginásios, restaurantes

chiques, carros caros e viagens paraísos

a camas giratórias, quartos flutuantes

em hotéis que arranham céus de infinitos pisos

 

a vidas impossíveis, espantosos vulcões

a trabalhos iguais a plantas carnívoras

que devoram vidas, almas, corações

criança a aproximar-se dum ninho de víboras

 

de Aquiles temíveis e Ulisses geniais

que ordenam o mundo como lhes compete

que de ansiedade ou medo nunca dão sinais

seguidos por exércitos, trompas e trompetes

 

todos maravilhas, puros predadores

felinos, canibais que comem as mulheres

intrépidos gurus no amor sem dissabores

que angélicos subiram ao céu dos prazeres

 

deuses detentores de alta sabedoria

incrível, sabem tudo: política, ciências

física, engenharia, química, economia

que Deus, o próprio, inveja excelsa inteligência

 

conhecem a fundo o mistério divino

e conhecem actrizes famosas, pessoalmente

que a Morte beijaram, enganando o destino

e nas filas passam a humanidade à frente

 

abraço solidário a solidão dos fracos

escolho ser sozinho, sou príncipe imperfeito

a chafurdar na lama, a caminhar nos charcos

para ser perfeito eu nunca tive muito jeito

Subterrâneos

Novembro 03, 2017

Vou por subterrâneos doentios onde habitam

as mais obscuras e perversas criaturas

onde prósperos noctívagos corvos crocitam

lúgubres melodias por recantos escuros
 

um velho a chapinhar com olhos nesses seios

de jovens que se empolgam no vácuo, com saltos

altos. Talvez seja o meu retrato, creio

podendo o meu futuro ser duro basalto
  

dilatadas, as narinas apuram mil essências

descobrem no ar aromas, desperdício e morte

de esbugalhados olhos, líquidos e ausentes

sinto cintilações de vícios de grande porte

deixa-me dar à chave e dar-se a combustão

beijando, musa, as partes lúcidas da Lua

cheia sem queixar-me fraco é o coração

grito o purpúreo sangue vivo que me insufle

 

deixa-me mergulhar no caos, dança da noite

de fumos em espiral de cápsulas humanas

por estes subterrâneos deambulando sou

mais corvo que os corvos, mais fraco que os humanos 

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